Começou em Maio. Era um dia qualquer que eu fazia coisas comuns. A semana de provas tinha acabado, e até que eu estava bem á toa naquele dia, Dancei sozinha no quarto, fiz umas lições e resolvi tomar um daqueles banhos que lavam até a alma da gente.
Senti um caroço em mim. Embaixo do seio direito. Duro. Tentei não pensar nisso, mas lá estava eu de novo conferindo pra ter certeza de que aquilo existia mesmo. Me passou um filme na cabeça.
2007. Minha vó diagnosticada com câncer de Mama. Fez radioterapia e o tumor sumiu por um tempo, mas voltou em 2009 mais forte e levou ela embora. 2010. Minha tia diagnosticada com tumor maligno nos seios, precisou amputar as duas mamas. Meu tio também passou por um leve caso de tumor no seio. O medo tomou conta de mim.
Primeiro porque eu estava com suspeita de uma coisa que eu não saberia com quem nem como falar. "Acho que tenho um tumor, você pode me ajudar?". Bom, às vezes eu tivesse caído e me machucado. Sei lá, hipóteses. Achei melhor dar um tempo.
Passei o resto daquele mês com medo de morrer. Um medo que eu nunca tive antes. Pensei nas hipóteses que eu poderia ter se fosse algo realmente grave. Eu teria que voltar pra São Paulo. Talvez trancar meu curso em Ouro Preto. Talvez fizesse Publicidade em alguma faculdade de São Paulo. Talvez tivesse que largar a vida que eu demorei tanto pra conseguir.
Sofri sim por antecedência. E calada. Ninguém era obrigado a carregar comigo esse peso, até porque eu não sabia o que era. Pensei em como tinha tão pouco tempo que eu vivia a vida dos meus sonhos e como era um presente de Deus eu ter vivido tudo aquilo. O medo tomou conta de mim.
Fui pra São Paulo na primeira oportunidade que pude. Como contar isso pra minha mãe? Contei pra ela depois de ir numa festa junina com meus amigos, que fui embora sem me despedir porque comecei a chorar sem poder explicar o que estava acontecendo pra eles.
A médica me pediu dois exames. Uma ultrassonografia e um exame de sangue. Deitei na maca e nunca um exame demorou tanto pra mim como aquele. Tinha uma tela que era visível ao meu olho. Observei como quem não se importa muito, mas me importando demais. O médico começou pelo seio esquerdo. Não tinha nada. Tudo normal. Depois o aparelho foi pro direito.
Começou na parte superior, onde não tinha nada. Aos poucos foi descendo. Até que apareceu. Lá estava o bendito caroço que eu sentia. O médico fez o trabalho dele. Tirou as medidas e não comentou nada comigo. Passou o aparelho pelo resto do meu seio, e pro meu desespero, apareceu mais um caroço. Meu olho encheu de lágrimas.
O dia seguinte foi imenso. Fui no cinema e assisti "A culpa é das estrelas". Saí do cinema aos prantos, e mais sem chão ainda. Péssima ideia estar com suspeita de ter um tumor e ir assistir um filme que falava exatamente disso.
Não chegava 17:00 de jeito nenhum. Meu pai tinha combinado de ir comigo buscar o exame. Minha mãe ia sair mais cedo do serviço. Era oficial: as pessoas estavam realmente preocupadas comigo. E quando deu 16:30 eu saí de casa, sozinha. Eu precisava enfrentar isso de frente.
Meu pai chegou uns 5 minutos depois que eu. Chegou com a mesma expressão de pânico. Peguei o exame e abri. Laudo: dois nódulos de aspecto comum e possívelmente benignos. Respiramos fundo. Não era o ideal, mas já era melhor que as outras possibilidades.
Fui diagnosticada com dois Fibroadenomas no seio direito. Dois nódulos sólidos, sem líquidos. Um com 1,5 cm no centro do seio e o outro com 2,3 cm, palpável no quadrante de baixo. É o tipo de tumor benigno mais comum nas mulheres em período fértil, e surge normalmente entre os 20 a 40 anos, sem causa aparente.
Comecei um tratamento de três meses tomando Esclerovitan. Não me privei das coisas que eu mais gostava de fazer, mas foi um período delicado. A médica tinha comentado que devido ao meu histórico familiar, se o remédio não fizesse efeito eu poderia ter que operar. O medo de acontecer algo que eu tivesse que tirar meu seio ou parte dele voltou a fazer parte de mim.
Passei a conviver com isso de uma forma mais amigável. Contei pros meus amigos mais próximos, mas ninguém quer que todos no mundo saibam que você tem dois nódulos no seio, mesmo que benignos. Sou orgulhosa o suficiente pra não querer conviver com as pessoas tendo dó de mim. Sou forte. Sempre fui. Não era agora que eu ia fraquejar.
Voltei pra Ouro Preto no final de Junho, disposta a mudar tudo na minha vida. Mudei de casa, doei metade do meu armário, voltei a escrever aqui, fazer dieta e atividade física e pensei em formas de não deixar que isso me afetasse.
Se Deus tinha me dado a vida que eu tanto sonhei, eu devia aproveitar. Voltei a ir em festas, comi algumas besteiras, ri bastante, fiz novos amigos, e voltei a andar com um sorriso no rosto. Eu merecia viver o que estava vivendo, agora mais do que nunca. E eu voltei mais forte depois dessa experiência. Aprendi a dar valor a coisas que são simples, mas trazem leveza à vida.
Me sinto uma jóia rara. Como se eu tivesse passado por um quase milagre. Eu sei que ainda não acabou e que tem muita gente no mundo em situações muito piores que a minha. Muitas vezes não podemos escolher ter um problema, mas temos a escolha de como vamos lidar com ele. E eu escolhi ir com um sorriso no rosto.
Volto pra São Paulo daqui duas semanas pra refazer meus exames e retornar no especialista. Não tenho mais medo de operar. Sei que sou forte, e tenho pessoas maravilhosas do meu lado que me darão todo apoio do mundo se precisar.
De qualquer forma, senti que precisava escrever esse texto como desabafo. Tem momentos na vida que não sabemos o que falar, nem como falar. Há coisas que só nós sentimos. Eu sei que ainda não acabou, mas agora sei que tenho forças pra lutar.
Obrigada a quem leu tudo e me acompanha sempre.
Obrigada a quem leu tudo e me acompanha sempre.